terça-feira, 5 de março de 2013

A pró-imperialista Yoani Sánchez e os debates no campo da esquerda: uma opinião socialista libertária


Federação Anarquista do Rio de Janeiro
Integrante da Coordenação Anarquista Brasileira
A vinda da “ativista” Yoani Sánchez despertou atenção de muitos, reacendendo um debate não apenas sobre o governo Cubano, mas também sobre questões-chave aos trabalhadores e aqueles que lutam. Modestamente, tentamos emitir nossa opinião sobre o tema. Ainda que o debate gere e reacenda muitas paixões, permitimo-nos tecer algumas considerações.
Que fique claro: uma pró-imperialista que defende a “liberdade” em marcos muito distantes dos da classe trabalhadora. Primeiramente, precisamos afirmar que há argumentos bastante plausíveis de que Yoani é sim uma agente do imperialismo estadunidense e que recebe apoio (financeiro, logístico e político) do governo dos EUA e/ou dos grupos anti-castristas da Flórida para promover seus ataques contra Cuba (amplo apoio tecnológico, de tradução, recursos, etc.). A blogueira defende, lamentavelmente, um capitalismo sui generis (ver entrevista citada no final deste documento), tudo o que nós socialistas libertários condenamos e combatemos. Assim, é preciso que fique bastante claro, que Yoani é uma inimiga de quaisquer avanços populares. Na sua vinda, por exemplo, foi recepcionada e ovacionada pelos setores da direita mais reacionária do país e que surfaram na “popularidade” fabricada de Yoani. Cabe ressaltar, também, o enorme destaque dado pela imprensa monopolista do RJ (Globo) e de SP (Folha e Estadão). Tal destaque não foi dado, por exemplo, ao militar que denunciou crimes de guerra dos EUA, Bradley Manning (que hoje se encontra preso nos EUA) e, tampouco, a Julian Assange, que revelou as entranhas do imperialismo com a wikileaks, sem qualquer defesa entusiástica por parte da mídia burguesa.
Neste caso, Yoani e a mídia corporativa na sua luta pela “liberdade” de expressão, enquadram-se na mentalidade e demandas (neo) liberais mais canhestras, pois prontamente atacam as conquistas sociais da Revolução Cubana. Posicionamo-nos, neste sentido, em repúdio à atuação desta personagem, que está sendo utilizada pelas instituições mais perversas do cenário mundial e que, ao que tudo indica, parece estar gostando disto. Aqui, por exemplo, foi recepcionada por deputados claramente vinculados a direita política, os mesmos que ajudam a oprimir nosso povo. Se a mídia burguesa e os setores de direita dão todo apoio a Sánchez isso indica que querem silenciar outras vozes, inclusive vozes críticas ao isolamento/burocratização de Cuba, mas que não fogem dos marcos de um socialismo que debata também a real socialização das decisões políticas. Neste ponto, estamos decididamente com a classe trabalhadora e seus lutadores. Repudiaremos quaisquer formas de imperialismos, que tanto massacram nosso povo e os povos em outras partes do mundo.
Fundamentamos essas questões a partir de um referencial classista, socialista e libertário, o qual não vamos abrir mão. A liberdade exigida por Yoani Sánchez não é nem de longe a mesma exigida por nós, anarquistas. Não pode haver, como bem ressalta Mikhail Bakunin, liberdade sem socialismo e, tampouco, socialismo sem liberdade, esta equação, que guardadas às ironias, é admitida como impossível por estalinistas e liberais e que orienta as demais considerações a seguir.
Além da denúncia da atuação lamentável de Yoani, cabe um debate necessário e fraterno sobre questões caras ao campo da esquerda e aos lutadores populares. Sabemos entretanto, que quando alguma organização faz este debate, o estalinismo costuma “colocar no mesmo saco” as críticas ao seu modus operandi pela esquerda, como “críticas de direita”. Quanto a esse procedimento histórico, só podemos lamentar sua profunda miopia política e falta de autocrítica. Falamos à partir de um lugar determinado. O lugar dos que lutam, dos que repudiam o imperialismo e dos que colocam modestamente sua pequena parte nas barricadas contra o capital.
A Revolução Cubana, que retorna na polarização Yoani e castristas ou pró-cubanos foi um marco para o imaginário e o avanço das lutas populares na América Latina. Os anarquistas, a despeito do desconhecimento ou silenciamento histórico sobre sua participação, cerraram fileiras com o povo cubano. Protagonizaram a revolução junto com outros setores populares, participando ativamente dos sindicatos que existiam em Cuba, à véspera da revolução e nas lutas que se seguiram. Com o golpe castrista, esses mesmos companheiros, que estavam juntos na luta, foram traídos por discordarem do modelo autoritário implementado paulatinamente por Fidel Castro e alguns membros de seu estado-maior. A lista de socialistas libertários perseguidos pelo regime castrista é longa. Rolando Tamargo e Ventura Suárez, fuzilados; Sebastián Aguilar Filho, assassinado a tiros; Eusebio Otero apareceu morto em sua casa; Raúl Negrín, acossado pela perseguição, se suicidou ateando-se fogo’. Por outra parte, foram detidos e condenados a penas de prisão os seguintes companheiros: Modesto Piñeiro, Floreal Barrera, Suria Linsuaín, Manuel González, José Aceña, Isidro Moscú, Norberto Torres, Sicinio Torres, José Mandado Marcos, Plácido Méndez e Luis Linsuaín, oficiais estes dois últimos do Ejército Rebelde (Exército Rebelde). Francisco Aguirre morreu na prisão, Victoriano Hernández, doente e cego pelas torturas carcerárias, suicidou-se; e José Alvarez Micheltorena morreu poucas semanas antes de sair da prisão”. Casto Moscú, como citado acima, foi preso na sede da ALC – que abrigara membros do M26J durante a revolução. Logrou um indulto e rumou para o exílio no México. Esses lutadores eram todos notórios anticapitalistas e antiimperialistas. Não se alinhavam com os que esmagam nossa classe, mas mesmo assim foram perseguidos por defenderem o socialismo libertário.
Os setores estalinistas, como vimos, logo que se encastelaram no poder, destruíram a diversidade das correntes de esquerda existentes em Cuba e limitaram profundamente as melhores possibilidades da Revolução. Esmagaram, assim, a heterogeneidade ideológica que permitia o debate fraterno e a democracia popular no campo da esquerda. O socialismo perseguido pela revolução cubana em seus horizontes logo se transformou em um primitivo capitalismo de estado, na ilha que ainda hoje depende da produção açucareira e do turismo. Muitos avanços e conquistas da Revolução foram mantidos e hoje são um orgulho para o povo cubano, como no campo da saúde e da educação. Mas o retrocesso produzido pelo estalinismo impediu o povo de construir o poder popular de fato. O processo revolucionário em Cuba não deve ser confundido com o castrismo, que nada mais é do que uma política de centralização do poder e de burocratização da histórica e heróica Revolução Cubana. Apoiamos o povo cubano e a Revolução e repudiamos firmemente o imperialismo estadunidense. Ao mesmo tempo, nos posicionamos sempre críticos e alertas ao estalinismo e a burocracia vermelha que esmagam as conquistas históricas das revoluções e silenciam as oposições de esquerda que intentam radicalizá-las. A burocratização das revoluções é sempre a primeira etapa da derrota popular. Assim o foi com a URSS e, ao que tudo indica, se o povo cubano não conseguir imprimir seu protagonismo por fora das burocracias, assim o será com a ilha de Cuba.
A democracia direta, que nós anarquistas defendemos, pressupõe o protagonismo e o federalismo como tática e estratégia que conforma o poder popular e constrói os instrumentos de luta da classe trabalhadora. O socialismo para nós não pode ser construído sem democracia direta e liberdade, tampouco sem classismo, ação direta e protagonismo popular. Na URSS, por exemplo, Leon Trotsky abriu, nesse sentido, um largo caminho para o estalinismo, militarizando os sovietes (conselhos de trabalhadores) e reprimindo brutalmente os trabalhadores que os defendiam. Liderando o Exército Vermelho, esmagou a comuna de Kronstadt e a Revolução Social na Ucrânia. Os trotskistas, sempre que falam de democracia, o fazem com um pesado “cadáver” histórico em seus ombros.
A defesa da democracia direta, do classismo e do poder popular passa pela nossa atuação nos movimentos populares, sindical e estudantil. Nesse caminho de construção dessa democracia direta e popular das bases acaba esbarrando com práticas de burocratização que abrem as portas para a falta de liberdade e para o possível retorno da direita ao cenário político após os processos revolucionários. Por isso, defendemos ampla participação popular e democracia direta, construindo um poder popular que emane das bases, para que não se encastelem nos movimentos populares (sindical, rural e estudantil) vanguardas que façam o povo deixar de decidir sobre seu próprio destino e freiem os processos revolucionários.
Combateremos sempre, como minoria ativa, quaisquer formas de imperialismo e de burocratização, assim como nos colocaremos permanentemente enérgicos contra a democracia burguesa que oprime os trabalhadores e trabalhadoras do mundo.
Todo apoio ao povo cubano! Fora Yoani Sánchez! Pela democracia direta e popular contra a burocratização!
Conferir mais sobre o tema:
Revolução Cubana: mais à esquerda que o castrismo

Fonte: FARJ

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